De Darwin às escolas do século XXI: ciência itinerante e interdisciplinar na Serra da Tiririca

Detalhes bibliográficos
Principais autores: Sandra Escovedo Selles, Martha Abreu
Formato: Online
Publicado em: 2008
Assuntos:
Acesso em linha:https://canalciencia.ibict.br/ciencia-em-sintese/artigo?item_id=26407
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abstract Foi realizado, neste estudo, um levantamento histórico das transformações do ambiente, baseada na leitura do livro Diário de um naturalista ao redor do mundo de Charles Darwin, dando destaque à passagem da sua expedição, no ano de 1832.
coverage A relevância da pesquisa está em analisar as possibilidades de um trabalho de formação continuada de professores, discutindo o potencial da utilização de registros históricos como subsídio para trabalhos docentes sobre questões ambientais, ao revisitar os caminhos de Darwin na Serra da Tiririca. Do ponto de vista ambiental, o discurso em vigor no mundo atual costuma acentuar a vilania humana, como o cerne do problema nas questões ambientais, e colocar a biologia (com destaque para a ecologia) como a ciência que resolveria os destinos do planeta. Por outro lado, no Brasil, muitos estudos criticam com ênfase tal posição e apontam a necessidade de uma abordagem para os problemas ambientais que considere a complexidade do seu objeto e o defina baseado em elementos econômicos, culturais, sociais e históricos como resultado de diversas áreas do conhecimento. Do ponto de vista educacional, o estudo conduzido por uma bióloga e uma historiadora de formação, compreender e contextualizar os problemas da ação do homem em relação ao mundo natural, não só é importante para configurar a parceria frutífera entre as áreas da biologia e história, como também para entender e problematizar a questão da temática ambiental conjugando diferentes pontos de vista interdisciplinares.
Estudo desenvolvido por pesquisadoras da Universidade Federal Fluminense (UFF), com abordagem pedagógica destinado a professores, reúne elementos sócio-históricos com referência a um ambiente ameaçado por interesses políticos, econômicos e ambientais: o Parque Nacional da Serra da Tiririca, situado entre os municípios Niterói e Maricá, no estado do Rio de Janeiro. A pesquisa tem como ponto de partida um levantamento histórico das transformações do ambiente, baseada na leitura do livro Diário de um naturalista ao redor do mundo de Charles Darwin, dando destaque à passagem da sua expedição, no ano de 1832, pelas cidades do Rio de Janeiro, Niterói e Cabo Frio, em especial à estrada que margeia a Serra da Tiririca. A VIAGEM No dia 29 de fevereiro de 1832, o H.M.S. Beagle, navio inglês a vapor, chegou à costa brasileira, na cidade de Salvador (BA), trazendo a bordo o jovem naturalista, então com 22 anos, Charles Darwin. Cerca de um mês depois, já no Rio de Janeiro, um conterrâneo inglês convidou Darwin para conhecer a sua propriedade, situada a aproximadamente 160km da então capital do Império do Brasil, às margens do rio Macaé. Deixando a cidade do Rio de Janeiro, no dia 8 de abril, o naturalista e seu grupo de sete pessoas seguiram na direção de Praia Grande, nome da cidade de Niterói à época. Ao cruzar as montanhas da região, Darwin, já em seu caderno de anotações, relatava suas observações sobre a bela paisagem pela intensidade das cores, sobre o céu e as águas, a grandiosidade e o esplendor da floresta, dentre outras descrições. OS NATURALISTAS Seguindo uma tendência esboçada pelos naturalistas desde o século XVIII, os objetivos de viagem de Darwin procuravam evidenciar o sentido científico, de organizar coleções e classificar tudo o que era observado. O desejo de viajar e colecionar já não obedecia apenas a uma aventura em busca do exótico, mas à realização de um espírito científico que procurava examinar e comparar espécies, estabelecendo diferenças e semelhanças entre aquelas existentes em regiões distantes, nos três reinos da natureza: mineral, vegetal e animal. Em diversos momentos do relato de Darwin, a coleta de plantas, flores, insetos, aves, peixes, fósseis e corais foi tão significativa que parecia ser a melhor resposta às suas infinitas perguntas sobre o porquê de as coisas serem desta ou daquela forma. Tudo o que via, intrigava e, desafiava a busca por explicações. O desafio que mais tarde ficou famoso, teria sido a base para a reflexão sobre a "origem das espécies", quando nas Ilhas Galápagos, Darwin ficou intrigado com a existência de determinados pássaros em um arquipélago tão distante do continente. A expedição do Beagle que circunavegou o mundo por cinco anos, entre 1831 e 1836, estava de acordo com os interesses da Inglaterra, cuja importância era estratégica e econômica. A viagem tinha por fim, essencialmente, localizar áreas como minas e roteiros de navegação entre os oceanos Atlântico e o Pacífico, com especial atenção na América do Sul, para investimentos e controle comercial. A SERRA DA TIRIRICA A descrição de Darwin em um mapa contemporâneo da região permite a identificação dos campos cultivados, provavelmente açúcar e café, atrás das lagoas de Piratininga e Itaipu em Niterói. Um trecho da estrada que acompanha a Serra da Tiririca situa-se na localidade que ainda hoje recebe o nome de Engenho do Mato, denominação de um engenho que já existia presente naquele tempo. Itaocaia é representada como um morro de granito e, a partir daí, as descrições dos marcos geográficos e naturais seguem o trajeto em direção à Lagoa de Maricá, marcado por pântanos, cuja estrada, de acordo com Darwin, percorria uma planície arenosa e estreita que fazia ligação entre as lagunas e o mar. A partir desse ponto, o grupo seguiu para o norte de Cabo Frio, depois de passar por diversas localidades que mantém algumas das denominações registradas por Darwin. O final da expedição foi um local mais montanhoso, subindo o rio Macaé. Nesta região, ao visitar outra fazenda, Darwin relata em seu diário uma iniciativa de desbravamento de matas para o cultivo de café, dando a entender ser recente a ocupação da área pelo dono da propriedade. Nas cinco páginas em que descreve a sua viagem por terra de Niterói ao rio Macaé, Darwin faz referência, em três longas citações, ao problema da escravidão e dos escravos. Na primeira delas, cruzando a Serra da Tiririca, após deixar o "pequeno vilarejo de Itacaia", denuncia os preconceitos sofridos pelos escravos. Em um dos enormes morros de granito – certamente o morro de Itaocaia –, Darwin registra que era famosa a história de uma "velha" que, ao ser capturada por soldados com seu grupo de quilombolas, dali havia se atirado. Para o naturalista, se o ato tivesse sido protagonizado por uma "matrona romana", seria "chamado de um nobre sentimento de liberdade". Numa pobre negra, era "apenas uma brutal obstinação". Na segunda passagem, no rio Macaé, Darwin ficou impressionado com o tratamento dispensado aos escravos e avaliou que, na fazenda visitada, "se a ideia da escravidão pudesse ser deixada de lado [...]", seria possível dizer que os "escravos vivem satisfeitos e felizes", em virtude do estilo patriarcal de vida e dos direitos dos escravos ao produto do trabalho do final de semana. Finalmente, na terceira longa passagem, "o último pedaço de terra cultivado que se vê" no rio Macaé, Darwin avalia e defende os "bons" sentimentos e os valores universais da humanidade, ao denunciar o proprietário e o que chamou de "atos de atrocidade que só podem acontecer num país escravista": a venda, que acabou não se realizando, de mulheres escravas, sem seus filhos e maridos. As críticas de Darwin à escravidão, entretanto, não encerram o pensamento do naturalista sobre a questão. Ao longo dessas três histórias, Darwin deu testemunho da luta de escravos fugidos, como os que "durante muito tempo" moraram no alto de um "daqueles enormes morros de granito" (a tal pedra de Itacaia/Itaocaia), conseguindo tirar sua subsistência do cultivo de um pequeno pedaço de terra próximo ao topo. Pelos registros em seu diário, Darwin parecia não temer uma posição definida em favor dos escravos, de suas potencialidades e sentimentos. No entanto, suas impressões ajudam a confirmar os recentes resultados da pesquisa histórica sobre escravidão e abolição no Brasil e no Caribe, em dois aspectos: primeiro, a importância do trabalho agrícola dos escravos aos domingos, quando poderiam complementar a dieta alimentar de suas famílias e exercer atividades autônomas, sem o controle direto do senhor ou feitor; segundo, a existência de pequenos quilombos nas proximidades de fazendas ou de centros urbanos, como o que teria existido no morro de Itacaia/Itaocaia.
Pedra de Itaocaia - Maricá/RJ
Casa Central do Engenho Sossego
Casa Central do Engenho Sossego
Casa Central do Engenho Sossego
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A pesquisa fez uso de registro histórico como tema gerador para o tratamento de um problema ambiental local, partindo da possibilidade de conjugar diferentes olhares disciplinares para estudar o ambiente. Para realizar o trabalho em conjunto, no processo ensino-aprendizagem, com foco na educação ambiental, foi privilegiada a formação de uma equipe multidisciplinar em nove escolas selecionadas dos municípios de Niterói e Maricá, no estado do Rio de Janeiro. A pesquisa pode ser vista como um processo que compreendeu três etapas: 1. levantamento dos registros históricos relacionados à passagem de alguns naturalistas pela região, bem como a localização em mapas do século XIX e atuais; 2. organização da atividade "Revisitando os caminhos de Darwin na Serra da Tiririca", dirigida aos professores das escolas participantes, compreendendo a realização de uma caminhada seguindo o roteiro de Darwin até Itaocaia, no município de Maricá; 3. encontro pedagógico em uma das escolas, para promover debate interdisciplinar com os professores que participaram da caminhada e com os professores especialistas responsáveis pela condução do debate. Do trajeto que compreende a Serra da Tiririca, participaram 34 pessoas na companhia de estudiosos da região que descreveram aspectos biológicos; apontaram os pontos mais ameaçados; identificaram e situaram, historicamente, as localidades; dentre outras observações. Com a pesquisa dos registros históricos e o mapa datado de 1851 do acervo da Biblioteca Nacional, foram permitidas a reconstituição da trajetória e a identificação da estrada utilizada por Darwin, bem como uma reflexão das alterações ocorridas nos planos biológico e social.
institution Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico
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Por outro lado, no Brasil, muitos estudos criticam com ênfase tal posição e apontam a necessidade de uma abordagem para os problemas ambientais que considere a complexidade do seu objeto e o defina baseado em elementos econômicos, culturais, sociais e históricos como resultado de diversas áreas do conhecimento. Do ponto de vista educacional, o estudo conduzido por uma bióloga e uma historiadora de formação, compreender e contextualizar os problemas da ação do homem em relação ao mundo natural, não só é importante para configurar a parceria frutífera entre as áreas da biologia e história, como também para entender e problematizar a questão da temática ambiental conjugando diferentes pontos de vista interdisciplinares. Estudo desenvolvido por pesquisadoras da Universidade Federal Fluminense (UFF), com abordagem pedagógica destinado a professores, reúne elementos sócio-históricos com referência a um ambiente ameaçado por interesses políticos, econômicos e ambientais: o Parque Nacional da Serra da Tiririca, situado entre os municípios Niterói e Maricá, no estado do Rio de Janeiro. A pesquisa tem como ponto de partida um levantamento histórico das transformações do ambiente, baseada na leitura do livro Diário de um naturalista ao redor do mundo de Charles Darwin, dando destaque à passagem da sua expedição, no ano de 1832, pelas cidades do Rio de Janeiro, Niterói e Cabo Frio, em especial à estrada que margeia a Serra da Tiririca. A VIAGEM No dia 29 de fevereiro de 1832, o H.M.S. Beagle, navio inglês a vapor, chegou à costa brasileira, na cidade de Salvador (BA), trazendo a bordo o jovem naturalista, então com 22 anos, Charles Darwin. Cerca de um mês depois, já no Rio de Janeiro, um conterrâneo inglês convidou Darwin para conhecer a sua propriedade, situada a aproximadamente 160km da então capital do Império do Brasil, às margens do rio Macaé. Deixando a cidade do Rio de Janeiro, no dia 8 de abril, o naturalista e seu grupo de sete pessoas seguiram na direção de Praia Grande, nome da cidade de Niterói à época. Ao cruzar as montanhas da região, Darwin, já em seu caderno de anotações, relatava suas observações sobre a bela paisagem pela intensidade das cores, sobre o céu e as águas, a grandiosidade e o esplendor da floresta, dentre outras descrições. OS NATURALISTAS Seguindo uma tendência esboçada pelos naturalistas desde o século XVIII, os objetivos de viagem de Darwin procuravam evidenciar o sentido científico, de organizar coleções e classificar tudo o que era observado. O desejo de viajar e colecionar já não obedecia apenas a uma aventura em busca do exótico, mas à realização de um espírito científico que procurava examinar e comparar espécies, estabelecendo diferenças e semelhanças entre aquelas existentes em regiões distantes, nos três reinos da natureza: mineral, vegetal e animal. Em diversos momentos do relato de Darwin, a coleta de plantas, flores, insetos, aves, peixes, fósseis e corais foi tão significativa que parecia ser a melhor resposta às suas infinitas perguntas sobre o porquê de as coisas serem desta ou daquela forma. Tudo o que via, intrigava e, desafiava a busca por explicações. O desafio que mais tarde ficou famoso, teria sido a base para a reflexão sobre a "origem das espécies", quando nas Ilhas Galápagos, Darwin ficou intrigado com a existência de determinados pássaros em um arquipélago tão distante do continente. A expedição do Beagle que circunavegou o mundo por cinco anos, entre 1831 e 1836, estava de acordo com os interesses da Inglaterra, cuja importância era estratégica e econômica. A viagem tinha por fim, essencialmente, localizar áreas como minas e roteiros de navegação entre os oceanos Atlântico e o Pacífico, com especial atenção na América do Sul, para investimentos e controle comercial. A SERRA DA TIRIRICA A descrição de Darwin em um mapa contemporâneo da região permite a identificação dos campos cultivados, provavelmente açúcar e café, atrás das lagoas de Piratininga e Itaipu em Niterói. Um trecho da estrada que acompanha a Serra da Tiririca situa-se na localidade que ainda hoje recebe o nome de Engenho do Mato, denominação de um engenho que já existia presente naquele tempo. Itaocaia é representada como um morro de granito e, a partir daí, as descrições dos marcos geográficos e naturais seguem o trajeto em direção à Lagoa de Maricá, marcado por pântanos, cuja estrada, de acordo com Darwin, percorria uma planície arenosa e estreita que fazia ligação entre as lagunas e o mar. A partir desse ponto, o grupo seguiu para o norte de Cabo Frio, depois de passar por diversas localidades que mantém algumas das denominações registradas por Darwin. O final da expedição foi um local mais montanhoso, subindo o rio Macaé. Nesta região, ao visitar outra fazenda, Darwin relata em seu diário uma iniciativa de desbravamento de matas para o cultivo de café, dando a entender ser recente a ocupação da área pelo dono da propriedade. Nas cinco páginas em que descreve a sua viagem por terra de Niterói ao rio Macaé, Darwin faz referência, em três longas citações, ao problema da escravidão e dos escravos. Na primeira delas, cruzando a Serra da Tiririca, após deixar o "pequeno vilarejo de Itacaia", denuncia os preconceitos sofridos pelos escravos. Em um dos enormes morros de granito – certamente o morro de Itaocaia –, Darwin registra que era famosa a história de uma "velha" que, ao ser capturada por soldados com seu grupo de quilombolas, dali havia se atirado. Para o naturalista, se o ato tivesse sido protagonizado por uma "matrona romana", seria "chamado de um nobre sentimento de liberdade". Numa pobre negra, era "apenas uma brutal obstinação". Na segunda passagem, no rio Macaé, Darwin ficou impressionado com o tratamento dispensado aos escravos e avaliou que, na fazenda visitada, "se a ideia da escravidão pudesse ser deixada de lado [...]", seria possível dizer que os "escravos vivem satisfeitos e felizes", em virtude do estilo patriarcal de vida e dos direitos dos escravos ao produto do trabalho do final de semana. Finalmente, na terceira longa passagem, "o último pedaço de terra cultivado que se vê" no rio Macaé, Darwin avalia e defende os "bons" sentimentos e os valores universais da humanidade, ao denunciar o proprietário e o que chamou de "atos de atrocidade que só podem acontecer num país escravista": a venda, que acabou não se realizando, de mulheres escravas, sem seus filhos e maridos. As críticas de Darwin à escravidão, entretanto, não encerram o pensamento do naturalista sobre a questão. Ao longo dessas três histórias, Darwin deu testemunho da luta de escravos fugidos, como os que "durante muito tempo" moraram no alto de um "daqueles enormes morros de granito" (a tal pedra de Itacaia/Itaocaia), conseguindo tirar sua subsistência do cultivo de um pequeno pedaço de terra próximo ao topo. Pelos registros em seu diário, Darwin parecia não temer uma posição definida em favor dos escravos, de suas potencialidades e sentimentos. No entanto, suas impressões ajudam a confirmar os recentes resultados da pesquisa histórica sobre escravidão e abolição no Brasil e no Caribe, em dois aspectos: primeiro, a importância do trabalho agrícola dos escravos aos domingos, quando poderiam complementar a dieta alimentar de suas famílias e exercer atividades autônomas, sem o controle direto do senhor ou feitor; segundo, a existência de pequenos quilombos nas proximidades de fazendas ou de centros urbanos, como o que teria existido no morro de Itacaia/Itaocaia. Pedra de Itaocaia - Maricá/RJ Casa Central do Engenho Sossego Casa Central do Engenho Sossego Casa Central do Engenho Sossego 00230_6.jpg A pesquisa fez uso de registro histórico como tema gerador para o tratamento de um problema ambiental local, partindo da possibilidade de conjugar diferentes olhares disciplinares para estudar o ambiente. Para realizar o trabalho em conjunto, no processo ensino-aprendizagem, com foco na educação ambiental, foi privilegiada a formação de uma equipe multidisciplinar em nove escolas selecionadas dos municípios de Niterói e Maricá, no estado do Rio de Janeiro. A pesquisa pode ser vista como um processo que compreendeu três etapas: 1. levantamento dos registros históricos relacionados à passagem de alguns naturalistas pela região, bem como a localização em mapas do século XIX e atuais; 2. organização da atividade "Revisitando os caminhos de Darwin na Serra da Tiririca", dirigida aos professores das escolas participantes, compreendendo a realização de uma caminhada seguindo o roteiro de Darwin até Itaocaia, no município de Maricá; 3. encontro pedagógico em uma das escolas, para promover debate interdisciplinar com os professores que participaram da caminhada e com os professores especialistas responsáveis pela condução do debate. Do trajeto que compreende a Serra da Tiririca, participaram 34 pessoas na companhia de estudiosos da região que descreveram aspectos biológicos; apontaram os pontos mais ameaçados; identificaram e situaram, historicamente, as localidades; dentre outras observações. Com a pesquisa dos registros históricos e o mapa datado de 1851 do acervo da Biblioteca Nacional, foram permitidas a reconstituição da trajetória e a identificação da estrada utilizada por Darwin, bem como uma reflexão das alterações ocorridas nos planos biológico e social. Darwin na Serra da Tiririca: caminhos entrecruzados entre a biologia e a história Foi realizado, neste estudo, um levantamento histórico das transformações do ambiente, baseada na leitura do livro Diário de um naturalista ao redor do mundo de Charles Darwin, dando destaque à passagem da sua expedição, no ano de 1832. 2008-10-02 https://doi.org/10.1590/S1413-24782002000200002 Ciências Humanas A pesquisa fez uso de registro histórico como tema gerador para o tratamento de um problema ambiental local, partindo da possibilidade de conjugar diferentes olhares disciplinares para estudar o ambiente. Para realizar o trabalho em conjunto, no processo ensino-aprendizagem, com foco na educação ambiental, foi privilegiada a formação de uma equipe multidisciplinar em nove escolas selecionadas dos municípios de Niterói e Maricá, no estado do Rio de Janeiro. A pesquisa pode ser vista como um processo que compreendeu três etapas: 1. levantamento dos registros históricos relacionados à passagem de alguns naturalistas pela região, bem como a localização em mapas do século XIX e atuais; 2. organização da atividade "Revisitando os caminhos de Darwin na Serra da Tiririca", dirigida aos professores das escolas participantes, compreendendo a realização de uma caminhada seguindo o roteiro de Darwin até Itaocaia, no município de Maricá; 3. encontro pedagógico em uma das escolas, para promover debate interdisciplinar com os professores que participaram da caminhada e com os professores especialistas responsáveis pela condução do debate. Do trajeto que compreende a Serra da Tiririca, participaram 34 pessoas na companhia de estudiosos da região que descreveram aspectos biológicos; apontaram os pontos mais ameaçados; identificaram e situaram, historicamente, as localidades; dentre outras observações. Com a pesquisa dos registros históricos e o mapa datado de 1851 do acervo da Biblioteca Nacional, foram permitidas a reconstituição da trajetória e a identificação da estrada utilizada por Darwin, bem como uma reflexão das alterações ocorridas nos planos biológico e social. https://repositorio.canalciencia.ibict.br/api/items/26407 https://repositorio.canalciencia.ibict.br/files/original/167aeb0835820d872a72b65d1a7d56e5aebdfd02.png https://repositorio.canalciencia.ibict.br/files/original/ebadbdd192f16d83a9df5c7b07b97888fe84154c.jpg https://repositorio.canalciencia.ibict.br/files/original/5daada55b4299481f00003dbb4f9ccb96907e125.jpg https://repositorio.canalciencia.ibict.br/files/original/032db1b7312ead6ac992aa8deec1d0eecef1c8b4.jpg https://repositorio.canalciencia.ibict.br/files/original/e3df3cf848f9277982b0a665d99bc806fa00ccf2.jpg https://repositorio.canalciencia.ibict.br/files/original/f0ba5158f1dc69e9592f5c2a55649dbd9041defa.jpg